sábado, 27 de outubro de 2012

Luz


luz
(latim lux, lucis)
s. f.
1. O que, iluminando os .objetos os torna visíveis.
2. Candeeiro, lâmpada, vela ou outra coisa acesa.
3. Efeitos de luz em quadro, fotografia ou outra representação.
4. O que ilumina o espírito. = CLARIDADE
5. Claridade de um astro. = DIA
6. Brilho, fulgor.
7. Critério.
8. Evidência.
9. Ilustração.
10. Publicidade.

Uma das coisas que mais me incomodava durante os diversos internamentos é a luz. Habituado a ambientes mais sombrios e à escuridão durante a noite a luz incomoda-me e impede o descanso. Ali havia sempre pretexto para manter a luz acesa. Ou por necessidade, descuido ou esquecimento. As luzes no tecto, em cima dos olhos, quando deitado, ou a luz no corredor que não podia ser desligada durante a noite. A luz individual, por cima da cabeceira da cama, ainda a que menos incomodava.

Havia sempre pretexto para manter a luz acesa, ou porque um doente ía ser transferido, ou porque se aguardava um doente que ía chegar, ou porque "não se vê nada", ou porque as luzes "se estão lá é porque são precisas".

Durante a noite a claridade na UCI era total e só conseguia dormir com umas vendas nos olhos o que ajuda muito as pessoas que têm grande sensibilidade à luz, ou têm dificuldade em dormir com luz, é o meu caso. Nas enfermarias era um pouco diferente, as luzes eram apagadas por volta das 23 horas e, a partir daí, o sono podia tomar conta de mim em geral "ajudado" por um comprimido para dormir.

Mesmo durante o dia é hábito manter difusores com quatro tubos fluorescentes acesos, e durante algum tempo tive de suportar nos olhos essa catadupa de luz, pois não era capaz de me levantar para as apagar.
A pouco e pouco, com a minha insistência, com os meus pedidos, todos foram percebendo o quanto me incomodavam as luzes acesas, e como ser um pouco mais exigente nesse aspecto tornava a minha "estadia" um pouco mais confortável. e, uma vez explicado, com insistência mas com educação e simpatia, acabamos por conseguir o que queremos, quando os pedidos têm bom senso e são de facto razoáveis.

A minha "guerra" com a luz acabou por ser ganha. Mas tive de fazer muitas adaptações, pois havia coisas impossíveis de fazer. Por exemplo, o corredor da UCIC ficava com as luzes acesas toda a noite, porque sendo apenas um único circuito, ou se mantinham as luzes todas acesas, ou pelo contrário teriam de apagar tudo, coisa não aceitável numa unidade como aquela. Assim a claridade só podia ser diminuida com as minhas vendas nos olhos.

É a luz que nos impede de ver, impede de dormir, a luz que não nos deixa observar "por dentro", que nos deixa despertos, pensamentos em estado de alerta, quando o que pretendia era exactamente o contrário disso, o descanso, o esquecimento de mim, esperar sem "medir" o tempo que passa.
Foi assim uma batalha contra a luz, uma batalha pelo lusco-fusco, que não pela escuridão. Tudo acabei por aceitar como me foi apresentado, mas procurando, com todo o cuidado, o melhor e maior conforto, pois sabia que ía por ali passar bastante tempo, um tempo que eu não saberia estimar.

Hoje, que se fala tanto em redução de custos, em poupar, veja este problema com outros olhos. Na realidade muito se poderia poupar com um pouco mais de atenção às luzes acesas totalmente inúteis. Mais poupança e mais conforto, pois muitos doentes queixavam-se do mesmo que eu, e referiam a incomodidade nos olhos causado pelo excesso de luz, e quanto interferia com a vista, pois estavam como eu próprio, muitas horas na cama, de costas, com os olhos pregados no tecto.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Casa


casa
(latim casa, -ae, cabana, casebre)
s. f.
1. Nome genérico de todas as construções destinadas a habitação.
2. Construção destinada a uma unidade de habitação, geralmente unifamiliar, por oposição a apartamento. = MORADIA, VIVENDA
3. Cada uma das divisões de uma habitação. = CÓMODO.CÔMODO, COMPARTIMENTO, DEPENDÊNCIA
4. Local de habitação. = DOMICÍLIO, LAR, MORADA, RESIDÊNCIA
5. Anexo a um edifício.
6. [Náutica]   [Náutica]  Compartimento destinado a máquinas ou equipamento especial (ex.: casa das máquinas).
7. Conjunto de pessoas da família ou de pessoas que habitam a mesma morada.
8. Conjunto de despesas com a habitação.
9. Estabelecimento comercial ou industrial (ex.: casa de chá, casa de fados, casa de hóspedes, casa de saúde). = EMPRESA, FIRMA
10. Lotação de um estabelecimento comercial, geralmente de diversão ou espetáculo (ex.: casa cheia).
11. Local ou instalação que se considera pertença de algo ou alguém (ex.: equipa.equipe da casa; jogar em casa).
12. Designação dada a algumas repartições ou instituições, públicas ou privadas (ex.: Casa da Moeda; Casa dos Açores).
13. Conjunto de pessoas que trabalham diretamente um chefe de estado (ex.: casa civil).
14. Família pertencente à nobreza ou à realeza (ex.: casa de Bragança).
15. Cada uma das divisões resultantes da interseção de linhas em tabela, tabuleiro, tabuada, mapa, etc.
16. Escaninho do tabuleiro do gamão.
17. Posição respectiva dos algarismos.
18. Abertura onde entra um botão de roupa. = BOTOEIRA
19. Número arredondado aproximado (ex.: ele anda na casa dos 40).
20. Posição de um algarismo em relação aos outros que compõem um número (ex.: casa das unidades, casa das centenas, casa decimal).
21. [Encadernação]   [Encadernação]  O mesmo que entrenervo.
 
 
Os primeiros dias de regresso a casa, em Fevereiro de 2011, deram origem a reações contraditórias. Claro que me sentia muito bem, finalmente livre das maiores dificuldades que alguma vez sentira na vida. Livre do quarto, da enfermaria, daquela cama onde morria aos poucos, na espera. No entanto a adaptação era dificil, e a minha autonomia reduzida, apesar dos esforços da MA para minimizar os problemas, trazendo as melhores soluções.
A cama teve de levar uma almofada para levantar os pés, devido ao edema, não tinha cadeira ou sofá onde me sentisse bem, o banho era complicado, embora se tivesse colocado pegas e um banco de apoio na banheira. Havia em mim uma tendência para replicar em casa os modos de funcionamento do hospital, que no caso funcionavam como referência. Movia-me com dificuldade, agarrado às paredes, as refeições não sabia bem como as fazer, as regras de higiene e limpeza causavam-me atrapalhação, pois muitas vezes não sabia bem como fazer, não tendo ainda autonomia para me deslocar no exterior, além disso havia chuva e frio, receando alguma constipação; tinha medo e tudo me assustava ou causava dúvidas. A MA fazia as compras, coisa que eu sabia que detestava, a comida, e tratava de mim. Mas via-se bem que tal era um peso, um sacrifício, ao dar~lhe estas "tarefas domésticas" que detestava, assim sentia-me mal também por isso. Demorei algum tempo a encontrar um equilíbrio, mais adequado; entretanto do Centro de Saúde obtinha todo o apoio de que necessitava, vinham fazer pensos, nas pernas, fisioterapia, para dar continuidade ao que iniciara no hospital.
A minha mobilidade evoluía pouco devido ao inchaço das pernas e pés, e as dores lombares e na coluna, que se tornavam cada vez mais duras. De noite tinha de me lavantar muitas vezes para o WC, com as dificuldades inerentes à minha mobilidade. Cheguei a ter saudades do urinol do hospital...
Os primeiros tempos foram dificeis; entretanto começava a rotina do acompanhamento em S.Marta, que de inicio era semanal. Ía num transporte dos Bombeiros, que me custava os olhos da cara. Levantava-me de madrugada, e ía a Lisboa, regressando no final da tarde. Cada viagem podia custar entre 120 e 150 euros, todas as semanas.
Habituei-me bem á medicação, reservara uma mesa apenas com esse fim, onde dispunha de mais de duas dezenas de medicamentos, ampolas, gases, pensos e outro material sobretudo para controlo da diabetes. Entretanto ocupava o tempo a ler, escrever, no computador ou na televisão. A rotina começava cedo, pois pelas 8h00 já tinha medicamentos a tomar, e deitava-me cedo, pelas 21h00 já estava estafado, e precisava de repouso. Por vezes deitava-me de tarde, para aliviar as pernas, aproveitando para retirar as meias elásticas, que me tinham sido prescritas, mas que muito me incomodavam.
Pouco a pouco recuperava as forças, a voz, espaço de manobra, e ía-me libertando da doença, e convivendo com o meu novo coração que se portava bem ao que se ía sabendo.

Medicamento


medicamento
s. m.
1. Substância que, devidamente manipulada, se aplica ao organismo doente com o fim de o curar.
2. Remédio.

Durante muitos anos até surgirem os primeiros sinais de doença cardíaca, da "cardiomiopatia ventricular diltada", com "insuficiência cardíaca grave", não tinha qualquer contacto com medicamentos. Era uma pessoa saudável, alguns pontos fracos, mas poucos, não carecendo de mais do que uns vulgares anti-inflamatórios, ou cêgripes, e pouco mais. Foi a doença cardíaca que modificou a minha relação com os medicamentos e com isso tudo se alterou na minha vida. Não estava preparado para esta dependência, mas posso assegurar que depressa nos habituamos, e diria que hoje até constitui uma "ocupação". A relação com eles é agora despreocupada e sem "dramas", garantindo as tomas nas doses adequadas, e nas horas certas. Penso que quanto maior a resistência aos medicamentos, mais dificil é conviver com eles e cumprir aquilo que pedem os médicos.

Fazer coincidir com momentos do dia como as refeições, ou o levantar ou o deitar facilita-nos a vida e evita esquecimentos, possuir uma folha terapêutica diária, como aquela que o Dr RS nos entrega nas consultas de rotina, também ajuda, qual lista de supermercado, a respeitar as horas, evita esquecimentos, mas no final acaba por ser memorizada. Também ajuda ter uma caixa doseadora que todos os dias, antes do jantar, preparo para o dia seguinte. Essa caixa tem compartimentos com a indicação do momento da toma e basta lá colocar os comprimidos, cápsulas e pastilhas para aquele momento. Assim gerir a medicação é mais fácil, sobretudo para quem, como eu faz 24 tomas diárias.

Existem medicamentos que não cabem nas caixas, ou apenas devem ser retirados das embalagens no momentos da toma, esses recorto-os e coloco junto da dita caixa para que não esqueça. Depois ainda há as saquetas, pipetas e outras "tretas", que registadas na folha terapeutica facilitam a aquisição do hábito.
De que estou a falar quando falo de medicação?
Bem, no total de um conjunto de medicamentos sob diversas formas, comprimidos, pílulas, cápsulas, saquetas, pingos, que no meu caso chegam a mais de duas dezenas de tomas diárias. A medicação anterior e posterior ao transplante é muito diferente, pelo que após o transplante, os hábitos mudaram, quer por ter-mos novos medicamentos quer por serem em maior quantidade e de maior responsabilidade. no que toca ao rigor das tomas e ao respeito dos horários.

Assim, mal mal me foram detectados os primeiros sinais da doença cardíaca grave, e ainda antes da primeira cirurgia, comecei de imediato a tomar diuréticos, medicamentos para controlar a tensão e o ritmo cardíaco, vaso dilatadores, e uma rastatina para controlar o colesterol; posteriormente aquando das crises de taquicárdia, comecei a tomar a amiodarona. A esta medicação junta-se a da HBP. Tudo isto eu tomava junto com as refeições ou não, em doses variáveis, geridas pela cardiologista, uma medicação que tomei durante cerca de quatro anos, desde os primeiros sintomas até ao transplante, que me manteve estabilizado, controlado e sobretudo vivo...No inicio estranhei. Assim como se fosse um idoso, sentar-me à mesa para uma refeição e alinhar em cima da toalha uma fila de comprimidos, inteiros ou em metades ou quartos, é algo "deprimente", sobretudo quando ainda nem se tem sessenta anos, sempre tive a ideia de que estaria incólume a este tipo de patologias mais graves, que aliás nunca se tinham manifestado. Depois habituei-me. Afinal não podia viver sem eles. A medicação foi.se mantendo de consulta para consulta, e apenas as doses eram alteradas, pontualmente, em função dos sintomas relatados ou das situações concretas que se íam passando. Mais tarde comecei também a tomar medicação para proteger o estômago da toma de determinados medicamentos. tudo medicamentos muito vulgares, a maioria no "top ten" dos mais consumidos no país. Pois, nada de muito original, ou as doenças cardio vasculares não fossem das mais vulgares e que têm associada uma das maiores taxas de mortalidade.

No período de espera por um dador, enquanto estive internado na UCI, para lá do já referido, juntaram-se antibióticos, nos momentos, e foram vários, em que algumas infeções me atacaram, medicamentos para a diabetes, que entretanto aproveitou a brecha, a debutamina 210, doseada através de um cateter, mantinha o estímulo que me permitia ter alguma "chama", mantendo o meu velho coração com um nível de funcionamente adequado, embora artificialmente, nível compatível com "serviços mínimos".

Após o transplante tudo se modificou. Deixei de ser um "doente cardíaco" e passei para outra categoria, um transplantado com as intercorrências e riscos associadados. O principal era o risco do sistema imunitário atacar o orgão, elemento estranho, invasor, que não pertence ao corpo original criado por Deus. Para isso se tomavam agora imunosupressores. Vitais para evitar a rejeição, a falha na sua toma poderia ter um desfecho fatal pelo que o rigor na toma é muito importante.

Também os corticóides marcaram presença, para prevenir infecções, e também pelo seu efeito imunosupressor. Outros antifungicos, antivirais, diuréticos, controlo de colestrol, etc.
Estado geral, em risco permanente, pode conduzir a outras patologias que carecem de terapia adequada. A diabetes, que implica a toma de insulina,  a tomboflebite, que recomenda anti coagulantes, os problemas da coluna, a osteoporose, enfim uma longa lista de situações potenciadas pela patologia ou pela própria medicação.
Pouco a pouco, à medida que a situação foi evoluindo favorávelmente, medicamentos houve que foram sendo retirados, ou cujas doses foram muto reduzidas. Para que tudo isto funcione é preciso rigor e organização, estruturar bem para que todas estas tomas não se tornem numa penalização insuportável.que tomam conta da nossa vida. Afinal tem de ser possível relativizar tudo isto, sabendo que a nossa qualidade de vida depende muito da toma correcta da medicação. E se é sacrifício pensemos nos outros casos, situações de pessoas sem solução, ou submetidas a muito maiores privações. Afinal a medicação não é o problema mas sim parte da solução.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Visita


visita
s. f.

1. Ato ou efeito de visitar.
2. Pessoa que faz uma visita.
3. Inspeção; vistoria.

visitas
s. f. pl.
4. Cumprimentos; lembranças; saudades.
visita de médicoa que é de curta duração.

visitar - Conjugar
v. tr.
1. Ir ver por cortesia, dever, curiosidade, caridade, etc.
2. Inspecionar, passar revista a.
3. Viajar por, percorrer.
4. Aparecer; mostrar-se; declarar-se.
5. Dar busca a.

Ao longo do internamento a minha relação com as visitas foi estranha e evoluiu com o evoluir da situação. Muitas vezes era agradável receber pessoas, outras não. Algumas teria preferido a solidão, outras, muita gente a meu lado. Não houve nunca um batalhão de gente comigo, sendo mais certo ter a MA, as filhas e pouco mais. Pontualmente o LM (visita que muito me espantou pelo interesse com que seguiu o problema), a C, o RM, a CA,  o AS, o Z e a T. A partir de determinado momento, a minha fragilidade era tal que já não era capaz de estar com as visitas, sobretudo com novas visitas, ansiosas de falar, de saber e trazer novidades, conhecer a "história", coisa que eu já tinha dificuldade em acompanhar mentalmente.

Perante isto, acabei por ser apenas acompanhado pela MA, as filhas, que naturalmente exigiam menos esforço da minha parte, e me traziam apoio psiquico e alimentar, e uma palavra amiga, numa fase em que praticamente nada comia, e o que me traziam do exterior era a única coisa que me agradava.

Foi dificil limitar, e algumas pessoas terão talvez levado a mal, terem sido "travadas". A minha energia já não era suficiente e tinha de a aproveitar para outras finalidades, sendo que a maior de todas era sobreviver. As visitas dos outros internados algumas vezes incomodavam, se bem que, estando a aguardar o transplante na UCIC, as visitas eram muito limitadas e bem controladas, e em geral, resumidas a apenas uma pessoa por doente e durante um curto período de tempo.

Certo que a intenção de todos era melhorar o "moral" do doente, mas nem sempre o que se fazia para esse fim era dessa forma entendido. Os sentimentos eram contraditórios e por vezes as alegrias das visitas eram compartilhadas e eram transmitidas, outras, pelo contrário, chocavam-me, pelo contraste com a minha situação, gerando mesmo alguma "revolta". Nem sempre o que era feito com uma intenção, era percebido por mim no mesmo sentido. Tudo era filtrado através de um filtro que mudava o seu critério em função da minha cabeça, e da forma como esta se encontrava. Tudo estava bem, mas nem tudo me fazia bem. Por vezes quando a visita saía eu ficava destroçado e revoltado.

Aos fins de semana, o grande vazio. Uma enorme avalanche de visitas mas para os outros. É no fim de semana que a maioria das pessoas vêm, mas para mim era mais durante a semana. Nunca tive falta de acompanhamento, nem de amizade e apoio. De qualquer forma eu estava sempre "acompanhado" com os meus livros, o computador, o blog, as minhas músicas, os meus cadernitos, tudo aquilo que povoava o meu pequeno mundo e o tornava melhor, mais pleno de coisas boas. Não pensar que é sobretudo dos outros que vem a mensagem de ânimo, mas desenvolver a capacidade de se auto animar.

As visitas nem sempre eram benvindas, reconheço, para quem está tanto tempo à espera, há momentos de fadiga, momentos em que a nossa solidão perante a morte nos ajuda, nos faz pensar, nos acrescenta a vontade de lhe fazer frente, e a presença de visitas, nesses momentos,  é um elemento que perturba essa solidão conveniente. Mas sem as visitas é dificil sobreviver, dificil estimular a esperança, e encher os depósitos com a dose necessária. O ideal é um equilibrio, nem demais nem de menos, e nos momentos certos (o que é dificil de adivinhar...) Entendo que quem tem um ente próxino doente, sofre por ele, sente a sua falta, procura a proximidade porque isso também lhe dá alento, e ajuda a suportar a dôr e a distância.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012


(latim pes, pedis)
s. m.

1. Parte do corpo humano que se articula com a extremidade inferior da perna.Ver imagem
2. Parte final dos membros, especialmente posteriores, dos vertebrados terrestres.
3. Parte que serve para sustentar certos móveis e utensílios.Ver imagem
4. Medida de extensão (= 33 centímetros).
5. Cabo (de utensílio).
6. Haste, tronco, raiz.
7. Pedúnculo, pecíolo.
8. Base, sopé.
9. Borra, fezes, sedimento.
10. O último parceiro a quem compete jogar.
11. O que fica da uva depois de espremida uma vez.
12. Espelho de um degrau de escada.
13. Pilar.
14. [VersificaçãoConjunto de duas a quatro sílabas que serve para medir o verso grego e o latino.
15. [Figurado]   [Figurado]  Modo, maneira.
16. Estado de um negócio, de uma empresa, de uma negociação.
17. Pretexto, motivo, ocasião.
18. [Encadernação]  Parte inferior do livro oposta à cabeça.
19. [Marinha]  Ponta do cabo c
Uma das maiores dificuldades após o transplante foram os edemas nas pernas e pés. Praticamente desde a cintura até às pontas dos dedos dos pés tudo era um enoeme inchaço, queimpedia ou dificultava muito a mobilidade. Os pés tornaram-se um enoeme peso para o resto do corpoe uns enormes "trambolhos", que tudo dificultava. Nada era fácil em tal situação.

Para contrariar mandavam-me manter os pés levantados, mais alto do que a cabeça. Assim dormia com os pés mais altos que a cabeça, sentava-me e pés eram colocados sobre um sofá ou uma cadeira; comia com os pés levantados. De tal forma que a coluna vertebral, para onde o peso era transferido acabava por se ressentircom muitas dores derivado do peso suplemantar que era obrigada a suportar. As dores eram imensas, e as mazelas mantiveram-se até hoje, agravando problemas que já teria, após longos meses deitado em espera. Tomava doses de diuréticos, urinava bastante, sobretudo durante a noite, mas o inchaço que melhorava muito durante a noite, quando estava na posição horizontal, mal me colocava na vertical, regressavm, e ao final do dia os pés eram o dobro do seu tamanho normal. dado que tinha na perna direita cicatrizes da anterior operação (by pass), feita há três anos, o inchaço nessa perna acabou por forçar a abertura dessa cicatriz, ao que se seguiu uma pequena infeção no local. Tinha um penso que cobria essa parte da perna, dia sim dia não era mudado, e a cicatriz era desinfectada, pois apresentava sinais de evolução duvidosa.

A solução proposta foi passar a usar meias elásticas, para compressão, mas os seus vincos, faziam muitas vezes garrotes que pioravam a situação. Até hoje ainda é a situação que se mantém, apesar de agora utilizar meias mais ligeiras. Foi uma fase que durou muitos meses para além da alta. O problemas nas pernas e pés acabou por evoluir para algo mais complicado, do domínio vascular, com o surgimento de trombo flebite numa das pernas,, e a oclusão das veias na outra perna, na direita, onde já tinha sido retirada a veia safena aquando da operação de by pass, dificultando a circulação. Entretanto a diabetes em nada ajudava na situação, e tudo era muito incomodativo, e tinha riscos. Mais uma das tais "intercorrências".

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Alta


alta
(feminino de alto)
s. f.
1. Aumento no preço ou no valor. = SUBIDABAIXA, DESCIDA, QUEDA
2. Permissão para o doente sair do hospital.
3. Documento que contém essa permissão.
4. Regresso de um militar ao serviço depois de baixa ou de licença.
5. Zona de uma povoação, geralmente de uma cidade, mais elevada em relação ao que a circunda. (Geralmente com inicial maiúscula.)
6. Parte da sociedade considerada de maior categoria ou de maior prestígio.
7. Demora, paragem.parada.


Após aquele quase mês no quarto, a que chamavam enfermaria, o Dr RS, começou a dar sinais de que a minha estadia estaria perto do fim. O edema nas pernas e pés mantinha-se, embora com algumas melhorias devido ao efeito de doses altas de diuréticos, exercício, pés e pernas colocadas em posição elevada, o que me incomodava, particulermente a coluna. As dores, nesse particular eram muitas, e as pernas assumiam um peso de toneladas, seja pelo seu inchaço, seja pela sua incapacidade de servir de base de suporte ao torax, pois a ausência de massa muscular era aflitiva. O peso, e sobretudo o músculo, tinha-se volatilizado, e agora, segundo a fisioterapeuta demoraria muito tempo a recuperar, talvez até anos. A destruição é rápida, a recuperação muito lenta.

Mal, com alguns dias de antecedência, o Dr RS começou a pôr a hipótese de alta, sempre com poucas palavras, eu percebi que estava por dias. O regresso a casa implicava alguns cuidados, nomeadamente o controlo total da medicação, que estava adquirido, uma aprendizagem relativa à alimentação, nomeadamente o que poderia ingerir ou não, e a forma de confecionar para evitar contaminações, os cuidados com higiene pessoal, com a limpeza da casa, que deveria ser objecto de uma limpeza profunda antes do neu regresso, nomeadamente quarto e casas de banho. Os agentes contaminantes eram muitos, e estavam por todo o lado. Da alimentação falarei mais tarde. Foi-me cedida uma brochura onde a informação acerca de alguns hábitos, atitudes e recomendações, sobretudo para os primeiros tempos.

Veio a Drª RBM, que me explicou tudo acerca da forma de lidar com a minha nova "coqueluche", a diabetes, a fisioterapeuta explicou que poderia optar por fazer recuperação cardíaca ali em S. Marta, mas tal implicava permanecer em Lisboa, coisa que era dificil, e preferia regressar ao Alentejo, de que tinha saudades, e finalmente uma conversa com o Dr RS com uma longa lista de perguntas que fiz e às quais respondeu, como sempre, poupando as palavras, mas sendo claro. Por exemplo, o uso da máscara, era para mim algo que teria de esclarecer, pois não seria necessário andar sempre com ela, mas apenas em situações de risco mais acentuado, como idas ao hospital, um ninho de bactérias, centro de saúde, sempre muito infectados com virus da gripe e outra "bicharada", zonas comerciais, transportes colectivos, presença de pessoas com gripe ou outras infeções e apenas durante os primeiros meses. Aos poucos iria abrindo até o seu uso poder ser quase totalmente evitado.

Entretanto a MA ía trazendo a roupa que levaria para casa, pois naquela altura, com menos 23 quilos, nada me servia, tudo era enorme, e não valia sequer a pena comprar novas roupas, pois não sabia para já qual seria a evolução. Tudo requeria adaptação.

Por outro lado, após a alta, iria iniciar um processo de acompanhamento que, durante seis meses, seriam visitas semanais a S. Marta, um esforço físico, pessoal e financeiro excepcional, pois, por coincidência, foi nessa altura que terminaram os apoios aos transporte de doentes em ambulância, forma como das primeiras vezes viria, e a vinda a Lisboa iria custar ceca de 140 euros por semana, pois tinha-me associado dos bombeiros, e isto era "apenas" 50% do valor a pagar. A vinda de carro seria possível mas inviabilizou-se, pois a condução em Lisboa não agradava à MA, e de transporte público para já não.

Na data aprazada para a alta, a MA ficou em casa para preparar tudo, e pelas 15h os Bombeiros foram-me buscar a S.Marta. Estava pronto, vestido, o que me custou muito, tinha as coisas arrumadas, coisa de que se ocuparam as minhas filhas, e vim de cadeira de rodas para a ambulância. Não foi necessário a maca, tudo correu da melhor forma. Ajudado pelo bombeiro, sr F, acabei por subir para a ambulância, e fizemo-nos ao caminho. Era fim de tarde de um dia de sol de Janeiro, e há muito que não saía do Hospital. A expectativa era grande, começámos pelo trânsito do Marquês de Pombal, ponte 25 de Abril, A2 rumo a Sul, o mais desejado. Tinha feito o trajecto inverso, pelo mesmo caminho, no inicio do Outono, este tinha passado, e já estávamos a meio do Inverno. Saboreava todo o ar que me rodeava, era fresco, não o ar empestado do hospital, podia usufruir do simples acto de respirar, coisa que há muito não sucedia. Os olhos toldavam com a claridade, felizmente alguém se tinha lembrado de me enviar uns óculos de sol, pois não suportaria a luminosidade, habituado que estava à penumbra. O bombeiro dizia ter pensado que iria buscar alguém de maca, prostrado, e afinal tinha-se admirado, como após menos de um mês depois do transplante, estava de pé, andava, embora com dificuldade, e só a magreza e as pernas inchadas e passo atabalhoado, indicavam que tinha estado doente de forma grave.

A travessia do Alentejo fez-se de forma rápida e sem dificuldades, o verde estava por todo lado pois tinha sido um ano muito húmido, tinha-me apercebido disso durante os meses de espera, e a natureza explodia, sobretudo o Baixo Alentejo, onde os campos eram exuberantes.

Cheguei a casa pelas 18h. Ajudaram-me a sair da ambulância e lá me fui "arrastando" até casa. A MA tinha telefonado á minha médica de família, DrªAM, que veio passado algum tempo, com o enfermeiro S, para tentar desde logo organizar um plano para as próximas semanas. Havia pensos a fazer, que iam ser feitos em domicílio, pois nem pensar em qualquer deslocação ao Centro de Saúde, por enquanto. Havia fisioterapia a fazer, em casa nos primeiros tempos, para tentar melhorar o meu desempenho e mobilidade, estaria assim dependente dessas visitas e da MA para tudo o restante, pois estava proibido de conduzir no mínimo por seis meses, não viesse a ser destruida a sotura que tinha no peito, com algum impacto indesejado. Estava então numa dependência dos outros, e só me restava, ler, escrever, ver televisão, consultar o computador. Um pequeno conjunto de actividades simples das quais pouco passaria. Já estava reformado, dado o anterior nível de insuficiência cardíaca, e as complicações que entretanto ocorreram recomendavam que me mantivesse em "serviços mínimos". Escusado será dizer quanto tal situação me penalizava, mas apesar de tudo tinha sido possível o mais difícil, tinha salvaguardado a vida, contra todas as investidas da morte, e muitas foram. Deus não me queria ainda no meio do seus.