quinta-feira, 26 de abril de 2012

Pastel de nata

pastel
(francês antigo pastel, bolo, bocado de massa)

1. [Culinária]  Iguaria de massa de farinha com recheio, doce ou salgada.
2. [Culinária]   Massa constituída por um aglomerado de ingredientes picados que é depois frita em pequenas porções (ex.: pastéis de bacalhau). = BOLINHO
3. [Informal, Figurado]   Pessoa de pouco préstimo, branda, indolente. = MANDRIÃO, MOLENGÃO
4. [Imprensa]   Folha mal impressa.
5. [Tipografia]  Carateres que ficam misturados e confundidos em consequência. de se ter desmanchado uma forma, uma coluna, etc.
[Culinária pastel de natabolo feito com massa folhada preenchida com recheio de natas.
s. m.



Estava internado há mais de duas semanas. Era  sábado, e nesse dia a MA tinha aulas e tinhamos combinado que nesse dia não haveria visita.
Como sempre aos fins de semana as enfermarias enchem-se de visitas. São procissões com dezenas de pessoas que visitam tudo e todos. Vêm em romagem das aldeias da planície e aproveitam para visitar os conterrâneos. O quarto encheu-se de mais de uma dezena de pessoas que faziam uma barulheira infernal. Não tendo visitas, voltei-me na cama e fechei os olhos depois do almoço, tentando o sono impossivel. Passei assim a tarde isolado e com sono, olhos semi-cerrados.
A MA, no entanto, mais uma vez surpreendeu-me. Afinal havia visita, e depois das aulas decidiu passar por Beja para me ver. Trouxe-me o jornal e dois pastéis de nata, trazidos de Grândola, da bomba de gasolina a que chamanos "a nossa bomba", tal a frequência com que, nas nossas andanças, lá passamos, paramos e petiscamos.
Acordei, li um pouco do jornal, decidi avançar para um pastel de nata. Comi apenas um. De nada mais me lembro. Sei o que me contaram depois.
Terei tido uma paragem cardíaca. Começou por uma rápida tontura a que se seguiu o desfalecimento em segundos. A cabeça caiu de lado na almofada, num gesto ligeiro, como se tivesse adormecido. A respiração parou, o cérecbro ficou em "black out". Felizmente a MA apercebeu-se de imediato.
Por mim acordei cerca de três horas mais tarde. Eram oito da noite. Durante este intervalo de tempo, a MA ao perceber a situação chamou um enfermeiro que passava no corredor, que procedeu de imediato à reanimação, um murro no peito, que me fracturou o externo. Entretanto a paragem foi detectada pelo sistema de telemetria a que estava ligado para monitorização, que interviu com um disfibrilhador manual, dando-me vários choque eléctricos. Feita a reanimação, fui transferido para os cuidados intermédios de cardiologia, no Hospital de Beja. A MA chamou a Drª MJ, era sábado, estava em casa, mas veio ao hospital. Tomou a decisão de me transferir de imediato para S: Marta, dado que a operação já estava agendada, embora ainda sem data. Quando acordei, estava numa maca, três ou quatro profissionais à minha volta chamavam "sr Carlos, sr. Carlos ". entre eles a Drª MJ. Já se tinha chamado uma ambulância com um enfermeiro para me transferir para Lisboa. Algaliaram-me, experiência nova, mas o estado em que estava, meio assustado, nem deu para oferecer resistência. Estava despido, foi tempo de me vestirem um pijama, chegaram os bombeiros e um enfermeiro e lá fui para S.Marta. Ficava agora para trás a minha cama junto à janela, a televisão, e duas semanas de estadia.
O caminho era mau, era a terceira vez que o fazia de ambulância, a sacolejar, em menos de três semanas. No meio parámos para medir a tensão, que fraquejava.
Chegámos a S. Marta já passava da meia noite. Pela primeira vez entrava na unidade de cuidados intensivos de S. Marta, onde teria de passar cerca de três meses, três aons mais tarde.
Ligaram-me  a umas maquinetas, um medicamento era perfusionado em permanência no meu braço ( a amiodarona), os alarmes tocavam, pim, pim, pim, e lá fiquei na cama do canto, um cantinho meu, entregue a um grupo de jovens enfermeiros, e de médicos. Ía finalmente descansar desse dia atribulado. Ouvi o relato do enfermeiro a passar a pasta aos colegas de S. Marta, e percebi tudo o que se tinha passado; arritmia ventricular seguida de paragem cardíaca, revertida entretanto. Doía-me muito o peito, devido ao murro renimador. Desta escapava, muitos não escapam e sucumbiram à temível paragem. A partir daqui começava a minha "aventura em S. Marta", que haveria de me levar ao transplante três anos mais tarde. Nunca mais as coisas seriam como dantes.
E começou com um simples pastel de nata, que, coitado, não teve culpa nenhuma.

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